As autoras nem sempre estão identificadas exclusivamente a partir da sua naturalidade; por vezes poderão estar identificadas a partir do espaço onde vivem ou a partir do qual o seu trabalho artístico e literário faz sentido. Estando incluídas várias autoras que pertencem às diásporas africanas - ou que nasceram no seio dessas diáspora, a delimitação e identificação do trabalho artístico e literário a partir de um espaço nacional faz progressivamente menos sentido porque as raízes e as suas vivências apontam para diferentes espaços e as escritas refletem esta multiplicidade e crescente desterritorialização nacional. São escritas que assentam em experiências-fronteira de sentidos - uma multiplicidade simbólica de periferias, agregando diferentes memórias e refletindo resistências a meros limites territoriais. Por isso mesmo, várias autoras serão frequentemente estudadas no âmbito do espaço luso-afro-brasileiro, numa confluência de experiências-fronteira.
MARIA HELENA SPENCER
(Santiago, Cabo Verde, 1911 - Faro, Portugal, 2006), funcionária dos correios, telefones e telégrafo, foi jornalista e repórter durante muitos anos, além de ter sido professora na ilha da Brava. Publicou os seus textos (entrevistas, crónicas e reportagens) em Cabo Verde - Boletim de Propaganda e Informação, estando grande parte reunida em Contos, crónicas e reportagens. Escreveu na segunda metade do século XX, altura em que a mulher praticamente não tinha espaço na literatura cabo-verdiana.
Fotografia retirada no site da Academia Cabo-verdiana de Letras
FÁTIMA BETTENCOURT
(Santo Antão, Cabo Verde, 1938), professora, jornalista radiofónica e colunista da imprensa escrita, estudou Magistério Primário em Lisboa. É membro fundador da Academia Cabo-verdiana de Letras (ACL) e membro da Associação dos Escritores Cabo-verdianos.
DINA SALÚSTIO
(Santo Antão, Cabo Verde, 1941), pseudónimo de Bernardina de Oliveira Salústio, é poeta, prosadora e ensaísta. Foi professora, assistente social e jornalista em Angola, Cabo Verde e Portugal, e no Ministério dos Assuntos Exteriores de Cabo Verde.
VERA DUARTE
(S. Vicente, Cabo Verde, 1952), descendente de judeus e primeira mulher a exercer magistratura em Cabo Verde, estudou Magistratura Judicial no Centro de Estudos Judiciários de Lisboa e Direito na Universidade Clássica de Lisboa. É Juíza Desembargadora, poeta e ficcionista, membro das academias Cabo-verdiana de Letras, de Ciências de Lisboa, Gloriense de Letras, investigadora correspondente do CHAM, Centro de Humanidade / NOVA FCSH/UAÇ, e membro do Institute for African Women in Law e do seu Global Advisory
CARLOTA DE BARROS
(Fogo, Cabo Verde, 1942) Em 1949, mudou-se, com a família, para Moçambique, onde permaneceu até 1957. Durante a infância, viveu nas ilhas do Fogo, Brava, S.Nicolau, e S.Vicente. Licenciada em Filologia Germânica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, é membro da Academia Cabo-verdiana de Letras (ACL), da Sociedade Cabo-verdiana de Autores (SOCA) e da Sociedade Portuguesa de Autores (SPA).
EILEEN ALMEIDA BARBOSA
(Senegal, 1982), poeta e contista cabo-verdiana nascida no Senegal. É formada em Turismo e Marketing pela Universidade do Algarve. Em 2014 ficou conhecida como um dos 39 melhores escritores africanos com menos de 40 anos.
Algumas das autoras africanas que se analisam neste projeto iniciaram a sua produção literária nos últimos anos do período colonial português e muitas continuaram ou começaram a escrever depois das várias independências, conquistadas em 1975, em Angola, Guiné-Bissau, Moçambique, Cabo Verde e S. Tomé e Príncipe. As várias obras das mulheres que integram o corpus deste projeto, não constituindo uma lista completa de todas as autoras que se encontram ativas nestes contextos, representam a relevância de analisar uma escrita que dá conta dos diferentes processos de violência e resistência a que se encontram sujeitas estas mulheres africanas. Entre eles, destacam-se vários aspetos de subalternidade política e social, assim como as experiências vividas durante a colonização portuguesa. Ter-se-á em conta os modos como as consequências deste passado se manifestam no dia-a-dia das mulheres destes países e o potencial de ação e reação a estes legados que a literatura exprime. A seleção de obras e autoras reflete ainda uma escrita que se configura como resistência a identidades nacionais pós-coloniais que foram dominantemente construídas em torno das vivências dos homens e de visões marcadas pelo patriarcalismo.